Após as brilhantes colheitas de 1979 e 1980, era suposto esperar um abrandamento na qualidade e quantidade de produção dos nomes 'novos' surgidos na ressaca do Punk. No entanto, impulsionados por uma imprensa que consegue, finalmente, acordar e deixar de ver o fenómeno pós-punk como algo passageiro e por uma indústria discográfica que rapidamente se recompôs do pequeno abanão ingénuo causado pelo 'do it yourself' que levou ao surgimento de pequenas e bem-sucedidas editoras, 1981 foi o ano do lançamento das obras-primas de muitas das bandas que marcarão a história do rock daqui para a frente.
Em Portugal, graças ao 'Rolls Rock' de António Sérgio e ás diversas crónicas semanais de Miguel Esteves Cardoso no 'Sete', 'O Jornal' e 'Expresso', as novidades chegam-nos em tempo real (ou quase). No entanto, os discos que escutamos e sobre os quais lemos, chegam a conta gotas ao mercado nacional e, na sua maioria, apenas podem ser obtidos nos circuitos de importação a preços proibitivos ou via Cobb Records, através de encomenda postal.
Um dos discos do ano é da autoria do presidente do clube de fãs dos Blondie em L.A., um puto com uma aparência a fazer lembrar um jovem Brando oxigenado e gorducho. Numa época de procura de novas sonoridades, os Gun Club editam 'Fire Of Love', um album carregado de energia punk que esgravata nos sons do passado, que cruza os sons dos blues do Delta com a anarquia sónica dos Sex Pistols.
A surpresa do ano é Grace Jones e o seu quinto LP 'Nightclubbing'. O álbum anterior, 'Warm Leatherette' (1980) era um disco interessante e retirava Jones do atoleiro do mainstream eurotrash onde andou a navegar nos anos do Studio 54. No entanto, a produção de Chris Blackwell e a sonoridade marcada pelos ritmos de Sly Dunbar e Robbie Shakespeare elevaram 'Nightclubbing' a um patamar bem acima da produção passada e futura de Grace Jones.
'Faith' promove os The Cure a principais candidatos ao trono dos Joy Division para gáudio da brigada da gabardina, orfã de Curtis. Para muitos é a obra-prima da banda, para outros é o início do fim de um caminho que será fechado com 'Pornography' e que levará a banda de Robert Smith ao cimo das tabelas pop e a encher estádios do futebol.
Os Psychedelic Furs editam 'Talk Talk Talk', um disco produzido por Steve Lillywhite, o wonder boy do momento. A produção liberta a banda do som confuso e sombrio do primeiro disco e inclui uma canção que, dentro de alguns anos, marcará o destino da banda, 'Pretty In Pink'. É o melhor album dos Furs e marca o fim de uma era. Com o próximo disco, 'Forever Now' e a contratação de Todd Rundgren, um produtor focado no mercado americano, a banda atirar-se-á para voos bem mais ambiciosos.
Se algo mais fosse necessário, David Byrne e Brian Eno continuam a mostrar quem manda nos Talking Heads. Depois de gravarem, praticamente sózinhos, os anteriores 'Fear Of Music' e 'Remain In Light', editam finalmente 'My Life In The Bush Of Ghosts', um disco cuja concepção iniciou no intervalo das sessões de 'Fear Of Music', em 1979. O disco é uma das grandes referências do ano, baseia-se em antigas experiências de bandas do rock alemão, principalmente os Can, e explora a fusão de ritmos africanos com gravações de origem diversa, de sermões evangélicos a exorcismos, antecipando o uso regular de samplers que se tornaria prática comum em meados da década. O duo colaborou ainda em 'Songs From The Catherine Wheel', a banda sonora encomendado por Twyla Tharp para um bailado da sua autoria. O álbum editado em 1981 é irregular mas inclui um par de boas canções que seriam apresentadas ao vivo nos concertos dos Talking Heads. A edição completa da banda sonora, em formato CD, em 2001, vem mostrar a verdadeira dimensão desta obra.
O disco do ano é 'Heaven Up Here' dos Echo & The Bunnymen. O segundo LP dos Bunnymen é um digno sucessor de 'Closer' como disco do ano mas, de certa forma, é uma obra que se encontra do outro lado da barricada. A produção é quase rude, não se escutam os rococós característicos do trabalho de Martin Hannett com os Joy Division, e as letras, sendo negras, estão carregadas de esperança. Se 'Closer' é o fim do caminho, o 'no future' no verdadeiro sentido do termo, 'Heaven Up Here' é o início de uma caminhada. Em direcção a quê, é o que falta saber.
Melhores do ano:
Heaven Up Here (Echo & The Bunnymen)
My Life In The Bush Of Ghosts (Eno/Byrne)
Fire Of Love (The Gun Club)
Juju (Siouxsie & The Banshees)
Talk Talk Talk (The Psychedelic Furs)
Psychedelic Jungle (The Cramps)
Faith (The Cure)
Tin Drum (Japan)
Red Mecca (Cabaret Voltaire)
Nightclubbing (Grace Jones)
Também vintage:
From The Lion's Mouth (The Sound)
Movement (New Order)
To Each… (A Certain Ratio)
Penthouse And Pavement (Heaven 17)
Nah Poo The Art Of Bluff (Wah!)
Honi Soit (John Cale)
Wilder (Teardrop Explodes)
The Flowers Of Romance (Public Image Ltd)
Non-Stop Erotic Cabaret (Soft Cell)
LC (The Durutti Column)
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